Quarta-feira, 29 de Novembro de 2006
Ontem tive a primeira sessão de radio. Conforme esperava, não custou nada. Penso que nem estive os 7 a 8 minutos que o médico falou, acho que foi menos. O pior foi depois. No regresso a casa senti-me um pouco mal disposta e azamboada, mas pensei que seria normal. Cheguei a casa pelas 22h e pouco e jantei frango grelhado com salada. Passados cinco minutos vomitei tudo. Uma hora depois, vomitei de novo. Fui deitar-me e ainda vomitei mais uma vez. Que sensação horrorosa! Ainda não tinha comprado o medicamento para os vómitos, o Primperan. Fui parva, mas nunca pensei ter reacções logo na primeira sessão. Hoje de manhã os meus pais foram comprar, tomei meia hora antes de almoçar e até agora aguentei tudo no estômago, estou mais animada.
Não fui trabalhar, porque não sabia como iria reagir com o almoço e porque parece que levei uma tareia, sinto as pernas doridas. Vamos ver como corre logo. Assim que lá chegar, pergunto se devo tomar o comprido antes ou depois do tratamento. Os intestinos também estão esquisitos e não estou com muito apetite. Mas já só faltam 29 sessões. E o que tem que ser, tem muita força!
Obrigada pelos vossos conselhos e carinho. Estou desejosa de ver tudo isto pelas costas!
Segunda-feira, 27 de Novembro de 2006
Como já fiz seis sessões de quimio, chegou a vez de ir fazer radioterapia e braquiterapia. Só depois é que faço as quatro sessões de quimio que faltam. Na sexta-feira, 17 de Novembro, fui à Clínica em Carnaxide onde farei os tratamentos, e tive consulta com o meu médico de radioterapia. Explicou-me que como tive focos em vários sítios, terei que ser irradiada numa zona grande, o que me irá apanhar os intestinos e afectar-me a flora intestinal. Falou-me de mais alguns efeitos secundários, como os enjoos e vómitos, e já estou com a medicação adequada em mãos para tomar se for necessário. Muito creme biafine na região onde for irradiada, bem como nas costas. Comida grelhada e cozida. E bom... quanto ao resto só vendo com o tempo. Serão 30 sessões, repartidas por cerca de sete semanas, de segunda a sexta-feira.
Depois da consulta, fui a uma sala tirar uma radiografia e fizeram-me uns traços com uns marcadores, nem percebi bem para que era. Depois deram-me umas injecções subcutâneas com tinta e segui para outra clínica ali perto, onde fui fazer uma TAC. Muito diferente das TAC normais, felizmente! Não tinha que estar em jejum nem levei contraste. Depois percebi que os infra-vermelhos detectavam a tinta que me tinham injectado, até me ajeitaram para apanharem bem esses pontos. Senti-me um bocado E.T. e até me deu vontade de rir.
Entre os tratamentos de radio, terei três sessões de braquiterapia. Na quarta-feira, 22 de Novembro, fui conhecer a minha médica nessa mesma clínica. É a única médica ginecologista no país que faz este tipo de tratamentos. Sinceramente, conforme ia ouvindo aquilo que me esperava, aumentava a minha vontade de fugir. Não vou explicar aqui, para não entrar em pormenores menos próprios, mas se alguém que vá fazer braquiterapia aqui passar e quiser saber melhor como é, esteja à vontade para me enviar um mail para
carla.pedro@gmail.com. Essencialmente, a braquiterapia consiste em radioterapia interna, pois as radiações entram em contacto directo com o nosso organismo. Como este tipo de cancro reincide frequentemente no local onde está a cicatriz da operação (cúpula vaginal), a braqui tem-se revelado bastante eficiente no combate a essa reincidência. Além do que me foi explicado pela médica, também andei a ler umas coisas e uma vez mais vi que o cansaço é um dos grandes papões destes tipos de tratamentos. Digo papões porque gostava de continuar a trabalhar, mas fui avisada que posso ter que parar conforme os tratamentos avançarem pois o corpo começa a ressentir-se com tudo isto. Também li que há quem perca o paladar e o apetite, mas a outras pessoas isso não acontece. Mas o mais aborrecido é que os efeitos normalmente mantêm-se durante algumas semanas depois de terminado o tratamento.
Claro que isto depende do organismo, da zona onde é feito o tratamento e de mais alguns pormenores. Por isso cá espero... Na segunda-feira vou fazer as marcações no corpo (vou andar toda pintada com uma tinta que não sai durante algumas semanas) e na terça-feira começo a radioterapia.
Entretanto, descobri três blogs sobre cancro da mama, onde se fala também de quimioterapia e radioterapia. Todos eles têm casos descritos na primeira pessoa que podem ajudar muito quem precise de mais informações sobre os tratamentos. Aqui estão:
Assim que tenha mais um tempinho, coloco aqui uns links que explicam melhor estes tipos de tratamentos. Até lá, as melhoras para todas e todos aqueles que lutam para vencer os seus bichinhos!
Quinta-feira, 9 de Novembro de 2006
7 de Novembro de 2006
“Há um lírio calado na minha sombra,
à espera da sua vez,
para desabrochar com mais força
do que todas as outras flores
que estiveram na minha luz.”
Hoje fui atendida mais depressa. Às 10h30 já estava a ser puncionada e comecei logo a levar soro. Só comecei o tratamento, propriamente dito, às 11h30. Foi correndo tudo bem mas, pelas 17h30, a enfermeira Ana viu um alto na minha mão e disse que a veia tinha rebentado. Por acaso não extravazou, por isso não me queimou a mão. Faltava cerca de meia hora para terminar. Se fosse menos, perdoava e não me picava de novo, mas assim não foi possível. Custou-me tanto! A punção é o que custa sempre mais. Mas enfim, já passou.
Enquanto eu estava no tratamento, a minha mãe foi ter com a minha médica à consulta e já temos a carta para apresentar na Clínica Quadrantes, em Carnaxide. Sei que vão ser seis semanas de rádioterapia e braquiterapia, mas só na próxima semana é que saberei se vai ser todos os dias ou não. Começo daqui a três semanas. Andei a ler sobre braquiterapia e vejo que tem tido muito êxito, mas não me agradou nada a ideia de rádioterapia interna, acho uma invasão. Mas pronto, tem que ser... A minha médica está mesmo decidida a eliminar qualquer hipótese de reincidências, acho eu. É uma excelente médica.
Como desta vez fiquei na sala pequena, que já tem os aparelhos que monitorizam a medicação, conversei mais. Éramos apenas seis e falámos imenso. A senhora que estava ao meu lado começou pela radio e agora está a fazer quimio. Primeiro teve cancro da mama e depois descobriu que tinha sido atingida também na vesícula e cabeça. É uma lutadora, tem um ar muito sereno. A mãe dela morreu há 27 anos, porque tinha cancro da mama mas não quis curar-se. Andou dois anos a resistir e quando finalmente decidiu tratar-se já não havia nada a fazer, já se tinha espalhado. Uma outra senhora que lá estava tem cancro na zona junto ao pescoço, anda toda curvada. Está sempre atenta para ver quando é que o tratamento está prestes a terminar e pede a uma das auxiliares para telefonar aos bombeiros do Carregado para que a vão buscar. Não tem ninguém... e eu vejo como sou uma sortuda.
Os meus pais levam-me sempre aos tratamentos, depois a minha mãe fica lá e quando termino o meu pai vai buscar-nos. Ainda hoje à tarde a minha mãe passou pela sala onde eu estava e perguntou se eu queria alguma coisa. Eu estava com desejos de um cheeseburguer da MacDonald’s e lá foi a minha mãe ao Rossio comprar-me um. E tem ido sempre falar com a médica enquanto eu estou nos tratamentos, caso contrário eu teria que lá voltar num outro dia. É tão bom termos quem nos ajude!
Sábado, 4 de Novembro de 2006
16 de Outubro
“Há hoje uma clareira aberta
na minha ânsia subcutânea”
Mais um dia passado no hospital. Passo o dia à espera que ele acabe. Já vou reconhecendo muitas caras, são-me quase todas familiares. Tive que ser puncionada uma segunda vez, quase no final do tratamento, porque quando fui à casa de banho o cateter saiu do sítio. A picada é o que custa mais, mas paciência. Levei nova dose de cortisona antes da segunda fase de medicação e não me doeu nada. Como as vermelhidões se mantiveram da última vez, trouxe mais uns comprimidos para tomar com o zyrtec. E já vou a meio J
Estão por lá muitas pessoas bem dispostas. Quando nos revemos, é uma festa. Então, tem corrido tudo bem? Faltam quantos? E mais perguntas do género. Ali, a preocupação é genuína. Hoje, uma senhora que estava ao meu lado, sentiu-se mal e vomitou. Senti-me tão impotente... O tratamento faz-lhe muitas borbulhas no rosto. Mas vamo-nos habituando a tudo. Queremos é que acabe depressa. E havemos de sair todos bem!
“Há pétalas de perfume no caminho.”
Estou tão feliz que até vejo o mundo ainda mais cor-de-rosa! Sinto-me na lua. Comovida, emocionada, grata!
Na sexta-feira, dia 29 de Setembro, fui fazer a TAC recomendada pela minha médica de quimio. Como ainda estava um pouco enjoada devido ao tratamento de segunda-feira, senti-me muito mal disposta ao beber um preparado horroroso antes do exame. Tive que beber três copos. Sabia a desinfectante (acho eu, porque nunca provei tal coisa)! Ainda por cima tinha que estar em jejum. Quando me deitei para fazer a TAC, só queria que terminasse depressa para poder regressar a casa e ir descansar. Disseram-me que tinha que fazer com contraste, por isso meteram-me um cateter na veia do braço direito.
Começaram a fazer o exame - demorou um pouco porque era TAC toráxica, abdominal e pélvica - e às tantas disseram-me que ia sentir-me quente, mas que era normal. Era o iodo a começar a correr, para fazerem com contraste. Senti-me insuportavelmente quente, que sensação tão esquisita! Depois, quando pararam, disseram-me para ficar deitada pois queriam ver se não era necessário repetir. Passado um pouco, avisaram-me que iam repetir tudo. O médico responsável veio ter comigo, perguntou-me a idade e profissão e quis saber a data em que fui operada, confirmando que me tinham retirado o útero, ovários e apêndice. Depois voltou à salinha onde estavam a efectuar o exame. Não faz tanta impressão como a ressonância magnética, pois não estamos fechados dentro de um tubo, mas eu estava desejosa de sair dali. Além disso, tinha fome, eheheh!
Quando terminou, o médico veio de novo ter comigo, e depois agarrou-me nas duas mãos, super querido, e disse-me: ‘Desejo-lhe muita sorte’. Está claro que podia ser uma mensagem meramente empática e de quem se preocupa, mas fiquei super mal... Nesse dia fartei-me de chorar, achei que ele tinha visto alguma coisa má... O resto do fim-de-semana também teve essa sombra a pairar. Felizmente, no sábado estive numa festa que me deixou bem disposta e não permitiu que eu pensasse tanto no assunto.
Na segunda-feira fui trabalhar e a minha mãe foi buscar os resultados da TAC. Entretanto, foi ao hospital tentar marcar consulta com a minha médica até sexta-feira. Às tantas, recebo uma sms da minha irmã a dar-me os parabéns por estar tudo bem! Nem queria acreditar! Falei logo a seguir com a minha mãe, que tinha conseguido falar uns minutinhos com a minha médica, que viu os exames e disse que estou bem. Imaginam a minha felicidade? Senti, naquele exacto momento, que tinha ganho uma vida nova! Só me apetecia dar pulos! O meu ex-marido ficou com os olhos brilhantes e um sorriso enorme e até me emocionei por ele estar tão feliz por mim. Foi logo contar a vários colegas meus, por isso passei a tarde entre sorrisos e abraços, foi tão bom! Como tive um serviço ao final do dia, esperei que acabasse para então começar a dar a boa nova aos meus amigos. Ganhei o dia, ganhei uma vida nova!
A médica disse que como o cancro do colo do útero é muito traiçoeiro, vou ter que continuar a fazer os tratamentos, mas agora o ânimo é outro! No relatório da TAC diz que estou limpa e sem inflitrações :) Andei tão deprimida e com maus pressentimentos e afinal estava tudo bem! Iupiiiiii!
As mensagens de resposta dos meus amigos fizeram-me sentir tão amada! E agora renasceu a esperança de poder cá andar por mais uns bons anos e poder assistir à felicidade de todos aqueles que amo. É tão bom!
25 de Setembro
“Não há calçada mais bem construída do que aquela que calcorreamos por nós acima.”
Mais um tratamento. Desta vez, tinha uma injecção de cortisona presa ao saco da segunda medicação, para ser administrada antes de dar início a esse tratamento. A única coisa que senti foi as mãos a ficarem muito quentes. Não achei nada de especial mas, mesmo assim, as enfermeiras desligaram a máquina por um bocadinho. Depois correu tudo bem.
Percebi que há lá senhoras que têm cancro da mama e que estão a fazer quimio antes de serem operadas. Deve ser para reduzir o volume do tumor. As enfermeiras perguntam qual é o peito e fazem a punção na mão desse lado. Isto porque, depois da cirurgia, não vão poder ser picadas nessa mão, por isso aproveitam e fazem-no agora.
Estava lá uma senhora que já ia na 37ª sessão. Meu Deus! Acho que 10 já são tantas... Há grandes heróis e heroínas ao meu lado, é isso que vejo. O importante é não desistir. Há sempre uma luz ao fundo do túnel. Pelo menos, acredito isso.
Vim para casa com zyrtec para tomar, por causa da reacção alérgica tardia que tenho sempre. Fico super vermelha às terça-feiras. A ver se passa.
Um grupo de amigos do fórum que frequento ofereceu-me um livro intitulado “Viver melhor a quimioterapia”, da Astrid Le Mintier. A minha mãe agarrou-se logo a ele, mas quando eu o ler digo se me ajudou. É suposto ser um guia prático com apoio psicológico, conselhos alimentares e receitas de beleza. Deve ser giro!
4 de Setembro
“Remei cá dentro,
no espanto da alma.
Os sonhos não se afogam.”
Desta vez voltei a ter reacção nos rins, mas chamei as enfermeiras mais cedo, pois apercebi-me logo do que estava a acontecer. Levei injecção, como da segunda vez, e depois passou. Já começo a ter medo daquilo, espero que não aconteça mais vezes!
Tive ao meu lado uma rapariga com uns 20 anos. Lindíssima. E dei por mim a pensar: bolas, porquê? Ela tem um ar determinado e acredito que tem muita energia dentro dela. A suficiente para dar cabo do bichinho, que não é de sete cabeças se soubermos gerir a situação. Sinto uma ternura enorme por todas aquelas pessoas que ali estão à espera da cura, como eu.