“Não acreditava que um dia destes chegasse. E agora, Março de 2007, veio com a brutalidade de uma explosão no peito. Não imaginava que fosse assim, tão doloroso e, ao mesmo tempo, tão pouco digno como a velhice e a decadência. Tão reles. O olhar de pena dos outros, palavras de esperança em que não têm fé.
(...)
Suceda o que suceder, uma coisa tenho por certa: isto alterou, de cabo a rabo, a minha vida. Ignoro em que sentido, ignoro como. Sei que alterou. Santa Maria. O que farei daqui para a frente, se existir daqui para a frente?
(...)
o cancro ratando ratando, injusto, teimoso, cego. Mói e mata. Mata. Mata. Mata. Mata. Levou-me tantas das pessoas que mais queria. E eu, já agora, quero-me? Sim. Não. Sim. Não – sim. Por enquanto meço o meu espanto, à medida que nas árvores da cerca uns pardais fazem ninho. A primavera mal começou e eles truca, ninho. Obrigado, Senhor, por haver futuro para alguém.”
António Lobo Antunes soube dizer, como só ele sabe, o que sentimos quando nos dizem que temos cancro. Quando de repente nos apercebemos com mais crueza de como a vida é frágil. Como é injusto que o corpo nos pregue uma partida quando a mente ainda quer viajar tanto. E o medo que se instala, a dúvida que nos faz vacilar, a ponto de já nem sabermos se queremos ir em frente, tal é o receio da decadência.
Há que suavizar a dor e o medo, seja de que forma for. Com coragem. Mas antes é preciso encarar esta dureza de frente. E chorar antes de levantar de novo a cabeça. Tenho conhecido pessoas maravilhosas que levantaram a cabeça e que são a prova de que é possível ganhar. Obrigada a todas.
Um beijo muito grande para quem trava esta batalha. Anixinha e Cláudia, a Primavera está à vossa espera!